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Os laços de sangue

Os cinco ensinamentos retirados dos pergaminhos de uma biblioteca.#

A tua origem#

Ao Magnífico Senhor Abade Otmarus,
Custódio da Vigília e Guardião das Verdades Antigas,

Submeto à vossa augusta consideração os frutos colhidos nestes últimos quarenta dias e quarenta noites, nos quais me entreguei ao silêncio e à vigília, consagrado ao estudo dos efeitos da Substância Vital sobre a carne dos filhos de Adão, conforme vossa recomendação velada e confiança sempre renovada.

Tomei três variações de servos — aos quais conferi nomes distintos, a fim de melhor registrá-los nos códices: Brother Alaricus, Benedicta e Ser Florens.

Brother Alaricus, monge caído da abadia de Varden, recebeu uma única dádiva em noite de tormenta. Após a ingestão, cessaram-lhe as febres, e suas forças dobraram-se. Cortes fecharam-se em poucas horas, e seus olhos tornaram-se vivos com novo fulgor. Contudo, seu semblante permaneceu alheio — sem afeição, apenas confuso e tomado de temor. Este estado — que anotei como primeira infusão — bastou para suspender a marcha da morte, mas não tocou a alma.

Benedicta, donzela muda recolhida das margens do pântano do sul, recebeu três porções ao longo de três ciclos lunares. Ao segundo cálice, passou a acompanhar-me com os olhos; ao terceiro, seguia-me com os pés. Quando me ausentei por um dia, deitou-se ao chão e chorou. Sua fidelidade ultrapassava a razão. Testei-a com ordens contraditórias: mesmo assim, manteve docilidade irracional, como cão ferido que lambe a mão que o açoita.
Assinalei este estado como ligação consumada. O sangue, tomado em número de três, sela não apenas o corpo, mas também a vontade — com grilhões de névoa e ferro.

Ser Florens, cavaleiro excomungado, tornou-se meu mais longo experimento. Recebeu o Dom Sagrado durante sete semanas ininterruptas. Tornou-se mais que servo: era extensão do meu gesto, antecipava minha vontade, percebia meus humores sem palavra. Mas sua alma tornou-se frágil: sem meu olhar, caía em silêncio; sem minha voz, recusava alimento. Afastei-me por sete dias, e ao retornar, encontrei-o ajoelhado, em jejum, com a pele pálida e a mente ausente.

Com base nos registros, confirmo:

• A primeira taça cura a carne e suspende o tempo.
• A segunda toca o espírito e o aproxima.
• A terceira sela a servidão.
• A repetição, porém, desfaz o eu — até que reste apenas reflexo.

Recomendo cautela no uso da Dádiva.
O servo feito só de fidelidade é inútil no pensamento.
Aquele que conserva o temor e o desejo, por vezes, serve melhor.

Que esta carta vos encontre em jejum de paixões e em abundância de juízo.

Escrita sob a bênção da nona hora, na cela baixa de pedra, ao vigésimo segundo dia da Colheita.

De vossa mão menor,
Servus Eremias

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